...Como um poema nos primeiros minutos, o fruto de uma noite de Iduméia: tão da gente, tão a gente mesmo...e depois tão não a gente, tão isolado e distante em seu raso mundo branco tamanho mapa. (Júlio Cortázar, Carta a uma senhorita em Paris, p. 18)
sexta-feira, 23 de março de 2012
Suicídio à moda do Porto
Um corpo cai e não é Hitchcock
Um corpo naufraga e não é Defoe
Um corpo em sua via crucis e não é Lispector
O corpo cai
O corpo não afunda
O corpo se vai
Segue o rio
Segue o fio
Segue à frente do navio
que desvia
E a velha portuguesa
grita
E o grito dura o tempo
que o corpo toca a leve
camada fria do rio
Ela se desespera
A velha portuguesa seca as mãos úmidas
em seu avental verde e amarfanhado
Não há corpo da marinha
Não há corpo de bombeiros
Não há corpo policial
Há, apenas, um corpo
a atravessar o Douro
a penetrar o Douro
a invadir o Douro
Na hora dourada do poente
Um grito não salva
uma alma que se solta
Um corpo solto
do meio da ponte
que os ferros de Eiffel sustentam
Um corpo não sustenta uma
alma
que imagina ter
asas
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